Obesidade feminina e fertilidade – Muito mais do que uma questão estética!
A elevada prevalência da obesidade em países desenvolvidos parece ser uma combinação de sedentarismo, maus hábitos alimentares e alta ingestão calórica. Nos Estados Unidos e em muitos países europeus, 60% das mulheres apresentaram sobre-peso (>25 kg/m²), 30% são obesos (>30 kg/m²) e 6% são obesos mórbidos (>35 kg/m²), segundo a classificação com base em critérios da Organização Mundial da Saúde (OMS).
A obesidade aumenta a morbidade e mortalidade como resultado de uma associação de uma série de problemas como as doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2, apnéia do sono, osteoartrite e câncer. No campo da ginecologia e reprodução, ela está relacionada a distúrbios da menstruação e ovulação, hirsutismo (excesso de pêlos nas mulheres), ovários policísticos, infertilidade, abortos e outras complicações obstétricas.
Problemas para engravidar são três vezes mais freqüente entre mulheres obesas, sendo que a presença da obesidade central (acúmulo de gordura na região abdominal) é a de pior prognóstico. Esta associação é devido a doenças endócrinas e metabólicas, tais como a produção excessiva de estrogênio, esteróides, perturbação do metabolismo, a descontrole dos hormônios envolvidos no controle da ovulação, tais como hormônio folículo-estimulante (FSH), hormônio luteinizante (LH), androgênios, insulina, leptina, adiponectina, e grelina. Todas essas alterações levam aos três importantes pilares da fisiopatologia que explicam a relação entre obesidade e infertilidade: hiperinsulinemia, hiperandrogenismo funcional e anovulação (ausência de ovulação).
Em ciclos de fertilização in vitro (FIV), a necessidade de doses mais elevadas de indutores da ovulação, a maior duração da estimulação ovariana e menor resposta do ovário à medicação são mais comuns entre as pacientes obesas. Estas complicações são devidas a uma maior resistência aos hormônios estimuladores da ovulação encontrada neste grupo mulheres, resultado de alterações na farmacocinética das drogas utilizadas em ciclos de estimulação ovariana, tanto por um problema de absorção como também de distribuição.
A qualidade do óvulo também parece ser afetada pela obesidade. Alguns autores têm sugerido que esses parâmetros sejam piores devido às elevadas doses de medicações necessárias para a estimulação ovariana destas pacientes. Recentemente, realizei um estudo no qual analisamos os resultados de 6500 ciclos de FIV, correlacionando-os ao IMC das pacientes. No grupo de obesas (> 30 kg/m²) foi observada uma maior necessidade de medicação para a estimulação ovariana. Além disto, verificamos nestas mulheres menores taxas de implantação embrionária, de gestação e de nascidos-vivos. Curiosamente, não foram encontradas alterações nos parâmetros utilizados para avaliar a qualidade do embrião, sugerindo um possível fator associado ao endométrio como responsável pelos piores resultados em pacientes obesas. Os artigo pode ser encontrado na sua íntegra na revista Fertility and Sterility 2010; 93: 447- 454.
Finalmente, as mulheres obesas têm maiores taxas de complicações obstétricas. A obesidade aumenta em até 18% o risco de morte materna e responde por 80% dos acidentes fatais por complicações anestésicas. Entre as intercorrências obstétricas, as mais importantes são hipertensão, diabetes gestacional, pré-eclâmpsia, embolia, macrossomia fetal, infecção urinária, prematuridade, óbito fetal inexplicado e complicações cirúrgicas (hemorragias e infecções).
Diante do exposto, fica clara a necessidade do cuidado holístico da mulher que deseja ser mãe. Como fomentadores da saúde feminina, cabe a nós ginecologistas orientar nossas pacientes que se encontram fora do seu peso ideal a tomar uma medida que vise não somente a uma melhora estética, mas da sua saúde como um todo. Devemos encorajá-las a adotarem estratégias que promovam o controle do seu peso através de dieta balanceada e atividade física sob orientação, antes de se buscar uma gravidez. Importante salientar que os tratamentos farmacológico e cirúrgico devem ser utilizados somente em casos de obesidade mórbida. Deste modo, a atuação de uma equipe multidisciplinar é fundamental, a fim de que uma gravidez, espontânea ou alcançada por meio da reprodução assistida, tenha um transcurso tranqüilo, prazeroso e mais seguro tanto para a mãe como para o bebê que está chegando.