Reprodução Assistida – Direito de todos! Uma reflexão também para todos!

Postado na categoria em e atualizado em 14/02/2011

Recentemente, o Conselho Federal de Medicina publicou a Resolução CFM 1957/ 2010 com o objetivo de pautar as Normas Éticas para a Utilização das Técnicas de Reprodução Assistida a serem seguidas pelos médicos especialistas em Reprodução Humana. Ela era muito desejada e esperada tanto pelos médicos especialistas quanto por várias pessoas que desejavam ser submetidas aos tratamentos, mas não eram impedidas uma vez que seus casos não estavam contemplados pela resolução antiga, a CFM 1358/ 1992, publicada no dia 11 de Novembro de 1992.

É com grande alegria que podemos dizer que a partir de agora, a Reprodução Assistida é um direito de todos! Depois de 18 anos, o Conselho Federal de Medicina revisou e publicou nova resolução, contendo poucas modificações; porém, significativas tornando o ato da Reprodução Assistida mais democrático. Na tabela 1 estão aspectos importantes da resolução que não sofreram alterações. Por outro lado, de uma forma resumida, as principais alterações foram:

1. Redefinição do número de embriões transferidos:

A resolução anterior estipulava a transferência de no máximo 4 embriões, independentemente da idade da paciente. Na atual, este número varia de acordo com a faixa etária em que se encontra a mulher: até 35 anos, máximo 2 embriões; entre 36 e 39 anos, máximo 3 embriões; 40 anos ou mais, máximo de 4 embriões. Tal medida visa reduzir a incidência de gestação gemelar, complicação evitável dos tratamentos de Reprodução Assistida que pode ocorrer em 25% dos casais.

2. Utilização de embriões e gametas de cônjuge post mortem:

A resolução anterior não contemplava esta situação, tendo o cônjuge vivo recorrer à justiça para requerer autorização judicial para a utilização de embrião ou gametas do cônjuge falecido. A atual, sim, contempla esta situação especial. No seu artigo VIII, diz que não é ilícito ético a reprodução assistida post mortem desde que haja autorização prévia específica do (a) falecido (a).

3. Realização de Reprodução Assistida em Solteiras e Casais Homossexuais:

Pela resolução anterior, somente casais estáveis ou “de fato” poderiam ser submetidos aos tratamentos. A partir de agora, a Reprodução Assistida pode ser aplicada a qualquer pessoa capaz que esteja de acordo com a realização deste procedimento. Desta forma, passa a contemplar a mulher solteira que deseja “uma produção independente”, isto é, ser mãe sem a necessidade (obrigatoriedade) de ter um parceiro. Estas mulheres terão de recorrer à utilização de sêmen proveniente de um banco. A doação ainda segue como anônima, não podendo o ato ser realizado com a ajuda de um amigo ou conhecido.

Casais homossexuais femininos poderão, da mesma forma, recorrer ao uso de sêmen proveniente de um banco. O sêmen poderá ser utilizado tanto para a realização da inseminação intra-útero (depósito do sêmen beneficiado em laboratório dentro da cavidade uterina) como para a fertilização in vitro (deposição de embriões obtidos pela fertilização em laboratório dos óvulos de uma das mulheres pelo sêmen de doador). A indicação da técnica respeitará indicação médica.

Já os casais homossexuais masculinos poderão também ter acesso à Reprodução Assistida. Neste caso, o processo é mais complicado uma vez que envolverá a doação anônima de óvulos, assim como uma mulher para levar a gestação aos nove meses (útero de substituição- doação temporária do útero). As normas para o útero de substituição seguem as mesmas da última resolução do CFM: as doadoras temporárias do útero terão que pertencer à família de um dos membros do casal, num parentesco de até segundo grau. Demais casos, deverão ser avaliados pelo Conselho Regional de Medicina para possível autorização.

Desta forma, podemos dizer que o direito à Reprodução Assistida se tornou universal, contemplando a pessoas que antes eram excluídas, impedidas de realizarem o sonho de constituir uma família, no seu sentido amplo. Claro, como qualquer avanço, gerará conflitos e questionamentos religiosos/ morais, que, a meu modo de ver, farão com que a sociedade reflita sobre este delicado tema.

Como “falha”, considero que esta resolução não seja completa, não abrangendo todos os âmbitos da Reprodução Assistida, mas é um passo, uma boa tentativa para corrigir lacunas que existiam na resolução anterior. A grande pena, que vale ressaltar, é que mais uma vez a sociedade avançou mais rapidamente que as leis do Brasil. Infelizmente, as leis existentes não são suficientes para regulamentar as questões que envolvem a filiação homoparental. Os problemas que vão surgir com esta nova realidade, como a indefinição da filiação das crianças nascidas com a aplicação das técnicas em casais homossexuais, farão com que rapidamente seja estabelecida uma lei que regule o tema, com o risco de que a marginalização deste grupo siga existindo, agora se estendendo aos seus filhos.

Itens importantes que não sofreram modificações

– Consentimento informado prévio obrigatório a todos os pacientes
– As técnicas não podem ser utilizadas para a seleção de sexo, exceto em casos de doenças hereditárias ligadas ao sexo
– Doação de gametas será sempre anônima, sendo que a identidade da doadora e da receptora nunca será revelada
– Criopreservação de embriões excedentes e viáveis, não sendo permitido o descarte
– Gestação de substituição (doação temporária do útero) permitida somente a parente até de segundo grau, sem fins lucrativos e comercial

Escrito por Marco Melo